Devastação da floresta tem o aval do marido de Marina

Devastação na Floresta Amazônica
Devastação na Floresta Amazônica

Os passos firmes com que avança na floresta amazônica e o corpo musculoso, embora pequeno, parecem desmentir os 65 anos de Francisco Maurício Rios. Ele segue a picada na mata da Reserva Extrativista Chico Mendes, em Xapuri, no Acre, até chegar às enormes toras de madeira de duas árvores derrubadas há poucos dias em sua propriedade. É uma espécie nobre, cumaru-ferro, com pelo menos 26 anos. “É um pau muito bonito, faz pena botar no chão”, admite.
Integrante do plano de manejo comunitário que começou este ano a extrair madeira na reserva, seu Francisco parece estar arrependido. “O dinheiro que me pagaram é muito pouco, não dá para nada”, lamenta.
Como ele, 800 produtores da reserva estão no meio de uma polêmica ambiental. Arregimentados pelo governo do Acre e com a permissão do órgão federal de fiscalização ambiental (o ICM Bio), integram o primeiro grupo a tentar ganhar dinheiro com a derrubada de árvores na reserva, iniciada em maio deste ano. Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Florestal, essa era uma antiga reivindicação dos produtores. Eles participaram de várias reuniões para iniciar o projeto, quase todas com a presença de Fábio Vaz de Lima.
Marido da presidenciável Marina Silva, ele era secretário-adjunto até meados de agosto e fez o possível para que o plano de manejo comunitário saísse do papel.
CHICO MENDES
Para antigos companheiros de Chico Mendes, no entanto, a extração de madeira é uma aberração que devasta a floresta e só rende lucros polpudos a grandes empresas. Um dos principais críticos é o sociólogo Elder Andrade de Paula, da Universidade do Acre.
Na década de 1980, ele criou a CUT no estado com Chico Mendes e, na de 1990, foi assessor no Conselho Nacional dos Seringueiros. “Esse é um golpe mortal na proposta original da reserva extrativista, que tinha o objetivo de evitar atividades destrutivas”, critica o professor. Para ele, os povos residentes ali sofrerão o mesmo problema que acontece em outras áreas de manejo: “Eles vão ficar sem as árvores e sem o dinheiro”.
Elder Andrade de Paula afirma que os produtores foram pressionados a aderir. O preço pago a eles é de R$60 por metro cúbico. Segundo o professor, o valor de mercado é centenas de vezes mais alto. Ele denuncia que o corte de árvores é feito de forma indiscriminada.
A exploração é através do governo estadual, que repassa a concessão para a derrubada e exploração comercial a uma cooperativa, a Cooperfloresta. Assessor técnico da entidade e presidente até o início do ano, Evandro Araújo de Aquino reconhece que o valor pago ao produtor é baixo, mas diz que é o máximo possível. “Seguimos o preço do mercado, que não está muito bom”, alega.
O valor repassado à cooperativa pelo metro cúbico é três vezes maior do que é pago aos produtores. Ele explica que do total são descontados custos de corte, transporte e comercialização de árvores. Aquino rebate a acusação de que a derrubada seja indiscriminada. “Seguimos os padrões técnicos”, afirma.
Também integrantes do plano de manejo comunitário, José Arnaldo Zacarias, de 36 anos, e sua cunhada Maria Célia Sampaio, de 37, acreditam que o próprio produtor poderia fazer o manejo, sem intermediação do estado. Assim, afirmam, a derrubada seria mais adequada e a remuneração bem maior. “Ao menos três vezes mais”, diz Zacarias.

‘Há muito dinheiro em jogo’
Antes de deixar o cargo de secretário-adjunto de Desenvolvimento Florestal do Acre, Fábio Vaz de Lima, marido da presidenciável do PSB, Marina Silva, fez o possível para que o plano de derrubada de árvores se tornasse realidade na reserva extrativista. “O Fábio teve participação muito importante nisso”, admite Evandro Aquino, da Cooperfloresta.
O marido de Marina foi acusado, pelo então deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), hoje ministro do Esporte, de ser “fraudador de contrabando de madeira”.
Mas o Ministério Público Federal não comprovou a acusação.“Há muito dinheiro em jogo, e o patrimônio público está em risco com a abertura do precedente da derrubada de árvores”, diz Elder Andrade de Paula, da Universidade do Acre.
Promessa de construção de açude
Uma acusação feita pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri é a de que os residentes na floresta são pressionados a aderir ao plano de manejo de várias formas. Uma delas é a oferta de construção de um açude a quem participar.
Evandro Aquino, da Cooperfloresta, diz que esse tipo de coisa não acontece. Mas Gerson Roque Lima da Silva, um dos produtores que participam do plano de derrubada, confirma: “Só recebe o açude quem aceita as condições e aceita o manejo comunitário”, afirma. O açude em sua propriedade está quase pronto.
Fonte: O Dia

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